Perdoar? Como?

6 de março de 2011





Oiessss pessoas. Lembram que eu havia dito que traria um texto sobre perdão? Então, chegou a hora rss

Sei que muitos leitores tem, de alguma maneira, algo a perdoar, e muitas vezes a dor é tão grande que se julga incapaz de um dia perdoar uma ofensa. Mas creia, isso é possível. Quando você entende porque sente raiva, ódio, contra uma pessoa, e entender o que acontece dentro de voce, o perdão fica mais fácil de acontecer.

Em uma linguagem mais simples, perdoar é você tirar de cima do outro, a culpa que você colocou. Quando você deixa de culpar o outro, aqueles sentimentos ruins em relação a ele tendem a desaparecer. Para explicar melhor, o perdão é como você liberar um réu de uma punição. É você deixar de imputar sobre o outro a responsabilidade de pagar pelo erro. É difícil perdoar porque achamos que, ao liberar o 'culpado' da sentença, estamos abrindo mão de nossa justiça por direito, e nos sentimos duplamente ofendidos. Você pode escolher entre o direito de cobrar a dívida, ou, alimentar o rancor dentro de você. Além disso, já falei aqui pra vocês os malefícios de se carregar o peso da falta de perdão. Quer ser curado? Perdoe!

Trouxe pra vocês um texto de um amigo psicanalista, que com atenção escreveu especialmente para o blog. Reflitam em suas palavras. Lembrem-se que o maior peso da falta de perdão, quem carrega é você.

Ah, o texto é de Luis Felipe Moura, Psicanalista - SP.  Se você está a procura de um bom terapeuta, eu o recomendo. 

Segue o Texto:


Por que é tão difícil perdoar?

Existem muitos motivos que podem levar alguém a ter dificuldade de perdoar. E seria difícil exauri-los num só texto. Hoje vamos abordar um motivo que é bastante comum no cotidiano: a necessidade que temos de nos cercarmos de pessoas a quem se atribuímos características negativas. 


Semana passada presenciei uma situação inusitada. Um senhor que, após conseguir brigar com a última pessoa com quem tinha amizade em seu ambiente de trabalho, afirmou não aguentar mais tanta maldade e gente ruim. É interessante observar casos extremos, porque eles trazem à tona mecanismos que uma pessoa comum não enxergaria em casos mais sutis. É bastante claro que a maldade que esse senhor não aguenta reside em si mesmo, e não nas outras pessoas. Mas nem sempre isso é tão claro como nesse caso. 


O ser humano é naturalmente composto de uma dualidade de sentimentos. Todos nós sentimos amor e ódio. Somos capazes de produzir afeto, assim como destruição. Nenhum ser humano é unicamente amoroso, assim como nenhum ser humano é apenas maligno. 


Perdoar pode ser difícil porque frequentemente temos a necessidade de que alguém em nossas vidas seja o vilão. O que seria do Batman sem o Curinga? O que faria o Super Homem sem o Lex Luthor? A razão é simples de entender: Se o outro é o vilão, então eu sou bom. 


Mas vamos dizer isso de uma outra forma: Quanto mais eu preciso ser bom, mais eu preciso que o outro seja ruim. Quem não se lembra de nos tempos de escola torcer para que a turma tirasse nota pior do que a sua? Quanto pior fossem os demais, melhor eu seria. Ou quem nunca sentiu uma pontinha de satisfação quando seu irmão esqueceu o aniversário de sua mãe, enquanto você ostentava, orgulhoso, um belo presente? 


Isso é observável em várias esferas do comportamento humano: família, trabalho, relacionamento a dois, entre muitos outros. E quanto mais frágil emocionalmente estiver a pessoa, maior a necessidade de dividir o mundo em bom e ruim. Porque para uma pessoa fragilizada emocionalmente, como no exemplo acima, a frustração de lidar com seu lado ruim é quase intolerável.  


Melanie Klein, uma das principais psicanalistas do último século, chamou esse fenômeno de identificação projetiva, o qual é definido por Hanna Segal da seguinte forma:


"Na identificação projetiva, partes do eu (self) e objetos internos são expelidos (split off) e projetados no objeto interno, o qual então se torna possuído e controlado pelas partes projetadas, identificando-se com elas… Várias partes do eu (self) podem ser projetadas, com vários objetivos: partes más do eu (self) podem ser projetadas a fim de se livrar delas, bem como atacar e destruir o objeto." (Introdução à Obra de Melanie Klein, p. 39)


Em termos bem leigos, funciona da seguinte forma: Eu não dou conta da dualidade dos meus sentimentos. Não dou conta de olhar para aquilo que em mim mesmo eu considero ruim, mau, ameaçador. Tenho medo de que esse meu lado ruim venha a me dominar, a tomar conta de mim plenamente, e venha a me destruir, ou a destruir aquilo que amo. 


Devido a isso, eu projeto essa maldade, esse lado ruim, em uma série de pessoas e circunstâncias exteriores a mim. Assim, consigo me manter longe da ameaça desse lado ruim, que pode me destruir.


Mas isso tem um preço. Para que seja possível fazer isso, eu preciso de objetos onde possa projetar esse sentimento ruim: Não sou eu que sou agressivo, é o meu colega de trabalho. Não sou eu que sou falso, são as pessoas da minha comunidade. Não sou eu quem é uma pessoa ruim, é o meu vizinho. Não sou eu quem é severo e punitivo, é o meu professor. E assim por diante. 


É claro que as pessoas ao nosso redor não são perfeitas, e muitas vezes elas irão fazer algo que nos atinge. E isso se torna justamente o pretexto emocional ideal para que eu as mantenha sob a ótica daquilo que eu não gosto em mim mesmo. Em outras palavras, se eu tenho um colega de trabalho que bate boca comigo, ou que se mostra agressivo em dadas circunstâncias, ele acaba justificando a projeção da minha agressividade sobre ele.


Mas se temos reações diferentes em situações quase idênticas, isso pode revelar que o problema é interno. Eu posso conhecer duas pessoas igualmente agressivas, ou ruins, e reagir de uma forma com uma, e de outra com outra. Uma pode me afetar mais do que a outra. E isso é um bom sinal de que o problema é interno. 


Voltando à pergunta do título: Por que é tão difícil perdoar? Em muitos casos, é porque significa desistir da identificação projetiva, isto é, desistir de tomar o outro como objeto mau, e aceitar que tudo aquilo que temo - ódio, agressividade, destrutividade - está dentro de mim mesmo. E isso significa que eu terei que lidar com esses sentimentos, e encontrar uma forma de me aceitar como ser humano. 


Se me encontro numa situação em que tenho dificuldade de perdoar alguém, posso me perguntar: O que é que essa pessoa revela sobre mim mesmo, que tanto me incomoda? Se eu encontrar a resposta, e for capaz de lidar com ela, o perdão decorrerá naturalmente disso. Perdoar o outro passa por "perdoar", ou aceitar, a mim mesmo. 


Nem sempre é possível encontrar essa resposta sozinho. Especialmente quando essa resposta é dolorosa demais, ou encontra-se reprimida de forma que é difícil tomar consciência dela. E todos nós temos situações assim. Nesses casos, uma boa análise ajuda no lidar com essas questões. 


Mas, em outros casos mais simples, mesmo uma simples reflexão individual pode nos trazer algumas respostas.


Luis Felipe Moura

Psicanalista







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Andressa Bragança