Yule, 22 de Dezembro
No Solstício de Inverno, os dois temas-de-Deus do ciclo anual coincidem – ainda mais drasticamente do que o fazem no Solstício de Verão.Yule, (que, segundo o Venerável Bedes, provém do nórdico Iul significando ‘roda’) marca a morte e o renascimento do Deus-Sol; ele também marca a conquista do Rei do Holly, Deus do Ano Minguante, por parte do Rei do Carvalho, Deus do Ano Crescente. A Deusa, que era a Morte-em-Vida no Meio do Verão, agora apresenta seu aspecto de Vida-na-Morte; pois embora nessa estação ela seja a “senhora branca leprosa”, Rainha da escuridão fria, ainda assim este é o seu momento de dar a luz ao Filho da Promessa, o Filho Amante que a refertilizará e trará de volta a luz e o calor para o reinado dela.
A estória da Natividade é a versão cristã do tema do renascimento do Sol, pois Cristo é o Deus-Sol da Era Cristã. O nascimento de Jesus não está datado nos Evangelhos, e não foi até AD 273 que a Igreja deu o passo simbolicamente sensível de fixá-lo oficialmente no meio do inverno, para alinhá-lo com os outros Deuses-Sóis (tal como o Mitras persa, também nascido no Solstício de Inverno). Tal como São Crisóstomo, Arcebispo de Constantinopla, explicou um século depois com uma elogiada franqueza, a Natividade “do Sol da Virtude” fôra fixada de forma que “enquanto os pagãos estavam ocupados com seus ritos pagãos, os cristãos poderiam realizar seus ritos sagrados sem perturbação”. “Profano”ou “sagrado” dependia do seu ponto de vista, porque ambos estavam celebrando basicamente a mesma coisa – o ciclo da maré anual da escuridão em direção à luz. Santo Agostinho reconheceu o significado solar do festival quando ele instigou os cristãos à celebrá-lo para aquele que criou o Sol, mais do que para o próprio Sol.
Maria em Belém é novamente a Deusa como a Vida-na-Morte. Jerome, o maior estudioso dos Padres cristãos, que viveu em Belém de 386 até sua morte em 420, nos conta que havia também um bosque de Adonis (Tammuz) ali. Já Tammuz, amado da Deusa Ishtar, era o modelo supremo naquela parte do mundo do Deus Morto e Ressucitado. Ele era (como muitos de seu tipo) um deus de vegetação ou milho; e Cristo absorveu este aspecto deste tipo tanto quanto o aspecto solar, como sugere o Sacramento do Pão. Assim como Frazer ressalta (O Ramo Dourado, pág.455), é significativo que o nome Belém significa ‘a Casa de Pão’.
A ressonância entre o ciclo do milho e o ciclo do Sol é refletido em muitos costumes: por exemplo, a tradição escocesa de manter a Donzela do Milho (o último punhado colhido) até Yule e então distribuindo-o entre o gado para fazê-lo se desenvolver todo o ano; ou, no outro sentido, a tradição alemã de espalhar as cinzas do Tronco de Yule pelos campos, ou de manter seus restos carbonizados para atá-los ao último fardo da próxima colheita (1).
(Aqui novamente nos encontramos com as propriedades mágicas de tudo à respeito do fogo do Sabá, incluindo suas cinzas; pois o Tronco do Yule é, em essência, a fogueira do Sabá trazida para dentro [da casa] pelo frio do inverno).
(1) A transferência mágica da fertilidade de uma estação para outra através de um objeto físico encantado – particularmente por grãos ou seus produtos, ou pelos subprodutos do fogo – é um costume universal. Falando sobre o templo de Afrodite e Eros no declive ao norte da Akrópolis, onde residia a ‘Afrodite dos Jardins’, Geoffrey Grigson nos conta: “Foi à este templo que duas garotas, duas crianças, faziam uma visita ritual em toda primavera, trazendo com elas, do templo de Atenas no topo, pães moldados como falos e cobras. No templo de Afrodite os pães adquiriam o poder da fecundidade. No outono eles eram levados de volta à Akropolis, e eram esmigalhados nas sementes, para assegurar uma boa produção após a próxima semeadura. (A Deusa do Amor, pág.162).
Mas retornemos à Maria. Era difícilmente surpreendente que, para a cristandade permanecer como uma religião viável, a Rainha do Céu tinha que ser readmitida à algo como o seu verdadeiro status, com uma mitologia e uma devoção popular que em muito excedia (algumas vezes até mesmo conflitante com) os dados bíblicos sobre Maria. Ela tinha que receber aquele status, porque ela respondia ao que Geoffrey Ashe chama “um anseio em forma de Deusa” – um anseio que quatro séculos de cristianismo pronunciadamente machista-chauvinista, em ambos os níveis divino e humano, tornaram insuportável. (Deve ser enfatizado que o machismo-chauvinismo da Igreja não foi
inaugurado por Jesus, que tratava as mulheres como seres totalmente humanos, mas pelo misogenista doentio e odiador do sexo São Paulo).
A deificação virtual de Maria veio com alarmante velocidade, iniciada pelo Conselho de Éfeso em 431 “entre grande júbilo popular devido, sem dúvida, à influência que o culto da virgem Artemis ainda havia na cidade” (Enciclopédia Britânica, tópico ‘Éfeso’).
Significativamente, isto coincidia intimamente com a supressão determinada do culto à Ísis, que tinha se espalhado através do mundo conhecido. Daí para frente, os teólogos lutarampara disciplinar Maria, permitindo sua hyperdulia (‘super-veneração’, uma versão graduada, única para ela, da dulia, veneração, consentida ao santos), mas não latria (a adoração que era monopólio do Deus masculino). Eles manipularam para criar, através dos séculos, uma síntese oficial da Rainha do Céu, pela qual eles realizaram o notável feito duplo de dessexualizar a Deusa e desumanizar Maria. Mas eles não podiam abafar o seu poder; é para ela que o adorador comum (não sabendo nem se preocupando com nada à respeito da distinção entre hyperdulia e latria) se volta, “agora e na hora da nossa morte”.
ERRATA : Onde se encontra “Senhora Branca Leprosa” é provável que o adjetivo se refira à cor, embora a mesma não conste nos dicionários comuns.
O protestantismo foi para o outro extremo e em graus variados tentou mais uma vez banir a Deusa por completo. Tudo que este conseguiu foi a perda da magia, a qual o catolicismo, seja de que forma distorcida e mutilada fosse, [ainda] mantia; pois a Deusa não pode ser banida.
(Para uma compreensão mais aprofundada sobre o fenômeno Mariano consulte as obras de Ashe A Virgem e de Marina Warner À Parte de Todo o Seu Sexo (?) (Alone of All Her Sex). a Deusa no Yule também preside sobre o outro tema de Deus- aquele do Rei do Carvalho e do Rei do Holly, que também sobreviveu na tradição popular do Natal, embora muito da teologia oficial o ignorasse. Na maré de Yule há um jogo, o brilhante São Jorge matou o negro ‘Cavaleiro Turco’ e então imediatamente gritou que havia matado seu irmão.
“Sombra e Luz, inverno e verão, são complementares um ao outro. Então vem o misterioso ‘Doutor’, com sua garrafa mágica, que ressucita o homem morto, e tudo termina com música e regozijo. Há muitas variações locais deste jogo, mas a ação é substancialmente a mesma em toda extensão”. (Doreen Valiente Um ABC da Feitiçaria – págs. 358-60). O jogo em Yule ainda sobrevive localmente – por exemplo em Drumquin, County Tyrone, onde jovens fazendeiros exoticamente mascarados e fantasiados vão de casa em casa encenando o antigo tema com palavras e ações trazidas desde seus ancestrais; a Radio Telefís Éireann fez um filme excelente sobre isto como sua obra para o Festival da Harpa Dourada de 1978.
Muitas vezes, naturalmente, o equilíbrio harmonioso dos gêmeos da escuridão e da luz, do minguar e crescer necessários, tem sido distorcido em um conceito de Bem-versus-Mal. Em Dewsbury, Yorkshire, durante aproximadamente sete séculos, os sinos da igreja tem badalado ‘o Badalar do Demonio’(?) ou ‘A Passagem do Velho Rapaz’ (?) na última hora da Véspera de Natal, alertando ao Príncipe do Mal que o Príncipe da Paz está vindo para destruí-lo. Então, a partir da meia-noite, eles dão salvas e saúdam o Nascimento. Um valioso costume, face à isto – mas de fato ele encobre uma triste degradação do Rei do Holly.
Suficientemente curioso, o nome popular ‘Old Nick’ (Velho Nick) para o Demonio reflete a mesma degradação. Nik era um nome para Woden, que é muito uma figura do Rei do Holly - tal como o Papai Noel é, de outra forma, São Nicolau (que no folclore primitivo não era transportado por renas mas cavalgava um cavalo branco através do céu – como Woden). Assim Nik, Deus do Ano Minguante, foi cristianizado de duas formas: como Satan e como o mais alegre dos santos. A Dança do Chifre de Bromley, de Abbot (agora um rito de Setembro, outrora um rito de Yule) é baseada na igreja paroquial de São Nicolau, o que sugere uma continuidade direta desde os dias quando o patrono da localidade não era Nicolau, mas Nik. (Sobre Nik e São Nicolau, consulte a obra de Doreen Valiente ABC da Feitiçaria, págs.258-9).
Incidentalmente, na Itália o lugar do Papai Noel é tomado por uma bruxa, e uma dama bruxa neste. Ela é chamada Befana (Epifania), e ela voa nas redondezas na Décima Segunda Noite em sua vassoura, trazendo presentes para as crianças através das chaminés. Uma extraordinária versão persistente do tema Rei do Carvalho/Rei do Holly no Solstício de Inverno é a caçada ritual e a matança dos wren (uma espécie de pássaro) – uma tradição folclórica considerada isolada no tempo e no espaço praticada nas antigas Roma e Grécia e nas atuais Ilhas Britânicas. O wren, ‘pequeno rei’ do Ano Minguante, é morto por sua contraparte do Ano Crescente, o robin de peito vermelho, que o encontra escondido num arbusto de hera (ou algumas vezes na Irlanda, num arbusto de holly, como é adequado ao Rei do Holly). A árvore do robin é o vidoeiro, que segue o Solstício de Inverno no calendário celta das árvores. No ritual representado, os homens caçavam e matavam os wren com galhos de vidoeiro.
Na Irlanda, o dia dos ‘Garotos Wren’ é o Dia de São Estéfano (?), 26 de Dezembro. Em alguns locais (a vila de pescadores de Kilbaha, em County Clare no estuário Shannon, por exemplo), os Garotos Wren são grupos de músicos adultos, cantores e dançarinos em trajes coloridos, que vão de casa em casa portando a pequena efígie de um wren em um arbusto de holly. Em County Mayo os Garotos (e garotas) Wren são festas de crianças, que também carregam arbustos de holly, batem em nossas portas e recitam seus temas para nós:
“O wren, o wren, o rei dos pássaros,
No Dia de Estéfano foi capturado no furze; (*)
Levante a chaleira e abaixe a panela,
E nos dê algum dinheiro para enterrar o wren”.
( * - tipo de arbusto)
Costumava-se dar ‘um penny’, mas a inflação deturpou a tradição. Toda a decoração de holly na Irlanda deve ser retidada da casa após o Natal; é considerado fator propício ao azar permitir que estes símbolos do Ano Minguante continuem. A aparente ausência de uma tradição de Meio de Verão correspondente, onde se esperaria por uma caçada ao robin, é enigmática.
Mas pode haver um traço disso na curiosa crença Irlandesa sobre uma Kinkisha (Cincíseach), uma criança nascida em Pentecostes (Cincís), sendo que tal pessoa está fadada ou a matar ou a ser morta – à menos que a ‘cura’ seja aplicada. Essa ‘cura’ é capturar um pássaro e esmagá-lo até a morte dentro da mão da criança (enquanto se recita três Ave Marias). Em alguns locais pelo menos, o pássaro tem que ser um robin, e nós achamos que esta é provavelmente a tradição original, pois Pentecostes é uma festividade móvel, caindo em qualquer data desde 10 de Maio até 13 de Junho – isso é, rumo ao final do reinado do Rei do Carvalho. Pode ser que há muito tempo atrás, uma criança nascida nessa estação corria o risco de se tornar um sacrifício substituto para o Rei do Carvalho, e que escapada melhor do que encontrar uma reposição na forma de seu próprio pássaro substituto, o robin de peito vermelho ? E o perigo de ‘matar ou ser morto’ pode ser uma recordação do destino de matar do Rei do Carvalho no Meio do Inverno e de ser morto no Meio do Verão. (2)
O robin do Ano Minguante nos leva até Robin Hood, aparecendo em ainda outro festival sazonal. “Em Cornwall”, Robert Graves nos conta, “Robin” significa falo. ‘Robin Hood’ é um nome campestre para campion vermelho (‘campion’significa ‘campeão’), talvez porque sua pétala fendida sugere um casco de carneiro, e porque Campeão Vermelho era um título do deus das Bruxas. . . . ‘Hood’ (ou Hod ou Hud) significava ‘tronco’ – o tronco colocado atrás do fogo – e era nesse tronco, cortado do carvalho sagrado, que se acreditou uma vez que Robin residia – daí ‘montaria [ou cavalo_?] de Robin Hood’, o parasita da madeira que escapava quando o tronco de Yule era queimado. Na superstição popular o próprio Robin escapou por cima da chaminé na forma de um robin e, quando Yule terminou, saiu como Belin contra seu rival Bran, ou Saturno – que tinha sido ‘Senhor do Desgoverno’ nos festejos da maré de Yule. Bran se escondeu da perseguição no arbusto de hera disfarçado como um Wren de Crista Dourada; mas Robin sempre o capturava e enforcava”. (A Deusa Branca, pág.397).
A menção do calendário celta de árvores (e de A Deusa Branca de Graves, sua análise moderna mais detalhada) nos traz de volta ao aspecto da Deusa e do Deus-Sol. Como será visto no nosso diagrama na página 26, as “Cinco Estações da Deusa” de Graves estão distribuidas ao longo do ano, mas duas delas (Morte e Nascimento) estão juntas em dias consecutivos no Solstício de Inverno, 22 e 23 de Dezembro. O último é um ‘dia extra’, que não pertence à qualquer uma das treze árvores-mês. Antes dele vem Ruis, a árvore-mês mais antiga, e após vem Beth, a árvore-mês vidoeiro. O padrão, cujo simbolismo valerá o estudo (embora preferívelmente no contexto do ano civil completo) é tal como segue, ao redor do Solstício de Inverno:
25 de Novembro – 22 de Dezembro : Ruis, a árvore mais antiga; uma árvore de julgamento e do aspecto sombrio da Deusa, com flores brancas e fruto negro (“Antiga é a árvore da Senhora – não a queime, ou serás amaldiçoado”). Pássaro, a gralha (rócnat); a gralha, ou corvo, é o pássaro profético de Bran, a divindade do Rei do Holly, que também está ligado aos wren na Irlanda, enquanto que em Devonshire o wren é o ‘cuddy vran’ ou ‘pardal de Bran’. Côr, vermelho-sangue (ruadh). Uma linha da Canção de Amergin: “Eu sou uma onda do mar” (para peso).
22 de Dezembro. Estação da Morte da Deusa: Árvore, o teixo, (idho), e a palmeira. Metal, o chumbo. Pássaro, águia (illait). Côr, muito branco (irfind).
23 de Dezembro O Dia Extra; Estação do Nascimento da Deusa: Árvore, fir (?) prateada (ailm), a Árvore de Natal original; também mistle-toe (?). Metal, prata. Pássaro, lapwing (?) (aidhircleóg), o piebald trapaceiro. Côr, piebald (algo como pintado ou malhado) (alad). Amergin pergunta: “Quem além de mim conhece os segredos dos dolmens não abatidos (?) ?”
24 de Dezembro – 20 de Janeiro: Beth, a árvore vidoeiro; uma árvore de começo e o exorcismo dos maus espíritos. Pássaro, faisão (besan). Côr, branco (bán). Amergin proclama: “Eu sou um cervo de sete chifres (?)” (para força).
O renascimento do Solstício de Inverno, e a parte da Deusa neste, foram retratados no antigo Egito através de um ritual no qual Isis circundava o santuário de Osíris sete vezes, para representar seu lamento por ele e suas andanças em busca dos membros espalhados de seu corpo. O texto de sua canção fúnebre para Osiris, no qual sua irmã Nephthys (que em um sentido é seu próprio aspecto obscuro) se reunira à ela, pode ser encontrado em duas versões de alguma forma diferentes em O Ramo Dourado, pág.482, e na obra de Esther Harding Mistérios da Mulher, págs.188-9. Typhon ou Set, o irmão/inimigo que o matou, era afastado pelo sacudir do sistro (tipo de sino_?) de Isis, para trazer o renascimento de Osiris. A própria Isis era representada pela figura de uma vaca com o disco solar entre seus chifres. Para o festival, as pessoas decoravam a parte externa de suas casas com lâmpadas de óleo que queimavam toda a noite. À meia noite, os sacerdotes emergiam de uma capela interna gritando “A Virgem concebeu ! A luz está aumentando !” e mostrando a imagem de um bebê aos adoradores. O posicionamento na tumba do Osiris morto era em 21 de Dezembro, após seu longo ritual de mumificação (que começava, interessantemente, em 3 de Novembro – virtualmente em Samhain); em 23 de Dezembro sua irmã/esposa Isis deu a luz à seu filho/outro self Horus. Osiris e Horus representam ao mesmo tempo os aspectos de Deus solar e vegetal; Horus é ambos o Sol renascido (os gregos o identificaram com Apolo) e o ‘Senhor das Colheitas’. Um outro nome de Horus, ‘Touro de Tua Mãe’, nos lembra que o Deus-criança da Deusa é, em outro ponto do ciclo, seu amante e fecundador, pai no devido curso de seu próprio self renascido.
As lâmpadas queimando toda a noite na véspera do Meio de Inverno sobrevivem, na Irlanda e em outros lugares, como uma única vela queimando na janela na Véspera de Natal, acesa pela pessoa mais jovem da casa – um símbolo da saudação microcósmica ao Macrocosmo, não diferente do lugar extra deixado na mesa de Pessach de uma família judia (em cuja mesa, incidentalmente, o filho mais jovem com sua pergunta “Pai, porque esta noite é diferente de todas as outras noites?”, também tem um papel importante a desempenhar).
A proprietária do pub da nossa vila oferece sua própria saudação microcósmica, seguindo uma tradição que ela nos diz que foi outrora difundida entre os donos de hospedarias irlandeses. Ela limpa um banco de estábulo, coloca palha fresca e deixa ali alguma comida, uma garrafa de vinho e uma mamadeira com leite- de modo que haverá ‘vaga na hospedaria’. Ela fica tímida para falar sobre isso mas lamenta que o costume pareça estar acabando.
Um amigo que viveu com os eskimós na Groenlândia, onde o cristianismo oprimiu um equilíbrio anterior bem integrado de crença e modo de vida, nos conta como os rituais do Solstício de Inverno morreram sem ser significativamente repostos. Pode-se dificilmente dizer que os eskimós celebram o Natal, em comparação com o festival tal como é conhecido nos países cristãos ‘antigos’; embora os ritos de solstício tradicionais (que aparentemente eram ocasiões memoráveis) não são mais observados pois eles dependem de cálculo exato do solstício através de observação estelar – uma habilidade que a geração atual não mais possui. Tudo para as bênçãos da civilização tecnológica !
Em Atenas, o ritual do Solstício de Inverno era o Lenaea, o Festival das Mulheres Selvagens. Aqui, a morte e o renascimento do deus da colheita Dionísio era encenado. No passado sombrio este tem sido um ritual de sacrifício do deus,e as nove Mulheres Selvagens picaram seu representante humano em pedaços e o comeram. Porém pelos tempos clássicos os Titãs se tornaram os sacrificadores, a vítima tendo sido substituida por um cabrito,e as nove Mulheres Selvagens se tornaram lamentadoras e testemunhas do nascimento. (Vide A Deusa Branca, Pág.399). As Mulheres Selvagens também aparecem nas lendas nórdicas; como as Waelcyrges (Valkírias) elas cavalgavam com Woden em sua Caçada Selvagem.
No ritual de Yule do Livro das Sombras, apenas o renascimento do Deus-Sol é apresentado, com o Sumo Sacerdote invocando a Deusa para “nos trazer o Filho da Promessa”. O tema Rei do Holly/Rei do Carvalho é ignorado – uma estranha omissão em vista de sua persistência no folclore da estação.
Nós combinamos os dois temas em nosso ritual, escolhendo o Rei do Carvalho e o Rei do Holly por sorteio, pois no Meio do Verão, imediatamente após o ritual de abertura – porém adiando o ‘assassinato’ do Rei do Holly para após a morte e renascimento do Sol.
Surge um problema a respeito da coroa do Rei do Carvalho; enquanto que no Meio do Verão as folhas de carvalho e holly são ambas disponíveis, em Yule as folhas de carvalho não estão. Uma solução seria armazenar folhas de carvalho de antemão no Verão ou Outono, pressioná-las e laqueá-las e fabricar uma coroa permanente do Rei do Carvalho para uso na maré de Yule. Outra solução, talvez menos frágil, é fabricar sua coroa permanente de frutos (?) de carvalho quando estiverem em sua temporada. Ou você pode usar as folhas de inverno do Olmo ou Carvalho Sempre Verde (Quercus iex). Tudo isso falhando, faça a coroa de galhos desfolhados de carvalho mas torne-os brilhantes com ouro falso (?) de Natal ou outra decoração disponível.
Em Yule, a Deusa é a ‘senhora branca leprosa’, Aquela de Cabelo Branco, Vida-em-Morte; assim, sugerimos que a Suma Sacerdotisa deveria novamente usar o chiffon branco ou tabard de filó (?) que nós descrevemos para Samhain. Uma adição dramaticamente efetiva, se ela possuir um ou isso possa ser disponibilizado, é uma peruca de branco puro, preferivelmente comprida. Se o seu coven operar vestido de céu, ela tirará o tabard antes do Grande Rito porém retenha a peruca se ela estiver usando uma, porque ela simboliza seu aspecto sazonal.
O lamento da Suma Sacerdotisa “Retorne, oh, retorne! . . .”, é uma forma ligeiramente adaptada do lamento de Isis por Osiris acima mencionado.
Se, isso é mais que provável, vocês tiverem uma árvore de Natal na sala, quaisquer luzes sobre ela deverão ser apagadas antes do Círculo ser lançado. O Sumo Sacerdote poderá então acendê-las imediatamente após ele acender a vela do caldeirão.
Caso haja uma lareira aberta no recinto, um Tronco de Yule poderá ser queimado durante o Sabá. Este deverá ser, naturalmente, de carvalho.
A Preparação
O caldeirão é posicionado próximo à vela do Sul, com uma vela ainda não acesa dentro deste e envolto com holly, hera e mistletoe.
Coroas para o Rei do Carvalho e o Rei do Holly estão prontas ao lado do altar. Um pouco de palha é colocada sobre o altar – tantos ramos quanto houverem homens presentes ao Sabá, exceto para o Sumo Sacerdote. Um deles é maior do que o resto e o outro é menor.
(Tal como no Meio do Verão, se a Suma Sacerdotisa decide por nomear os dois Reis ao invés de sortear, as palhas não serão necessárias).
Uma venda para os olhos do Rei do Holly está preparada próximo ao altar.
Um sistro (?) para a Suma Sacerdotiza é colocado sobre o altar. O Sumo Sacerdote vestirá
um tabard branco e, caso ela assim escolha, uma peruca branca. Caso haja uma árvore de Natal com luzes no recinto, as luzes deverão ser apagadas. Caso haja uma lareira aberta na sala, será produzido fogo até que esteja vermelho e brilhante, e um Tronco de Yule é colocado sobre este um pouco antes de o Círculo ser lançado.
O Ritual
Após a Runa das Feiticeiras, a Donzela traz as palhas do altar e as segura em sua mão de forma que todas as pontas estejam com seus comprimentos variados mas ninguém deve saber qual é o galho mais curto e qual é o mais longo. A Suma Sacerdotisa diz: “Que os homens façam o sorteio.”
Cada homem (exceto o Sumo Sacerdote) retira um galho da mão da Donzela e o mostra à Suma Sacerdotiza. A Suma Sacerdotiza aponta para o homem que tirou o ramo curto, e diz: “Vós sois o Rei do Holly, Deus do Ano Minguante. Donzela, traga sua coroa!”
A Donzela coloca a coroa de folhas de holly sobre a cabeça do Rei do Holly.
A Suma Sacerdotisa aponta para o homem que tirou o ramo comprido, e diz: “Vós sois o Rei do Carvalho, Deus do Ano Crescente. Donzela, traga sua coroa!”
A Donzela coloca a coroa de folhas de carvalho sobre a cabeça do Rei do Carvalho.
Enquanto a coroação prossegue, o Sumo Sacerdote se deita sobre o chão no centro do Círculo, curvado em uma posição fetal. Todos fingem não vê-lo fazer isso. Quando a coroação termina, o Rei do Carvalho diz :
“Meu irmão e eu fomos coroados e estamos preparados para nossa disputa. Mas
onde está o nosso Senhor o Sol?”
A Donzela responde :
“Nosso Senhor o Sol está morto!”
Se o tabard da Suma Sacerdotisa tiver um véu, ela o puxa por sobre sua face.
O coven se arruma ao redor do perímetro do Círculo.
A Suma Sacerdotisa pega o sistro, e a Donzela pega uma vela. Elas caminham juntas vagarosamente só redor do Sumo Sacerdote, deosil, sete vezes. A Donzela segura a vela de forma que a Suma Sacerdotisa possa ler o seu texto, e conta silenciosamente “Um’, “Dois”, e assim até chegar à “Sete”, assim que cada circuito for completado. Enquanto elas seguem, a Suma Sacerdotisa chacoalha seu sistro e lamenta:
"Retorne, oh, retorne!
Deus do Sol, Deus da Luz, retorne!
Teus inimigos fugiram – tu não tens inimigos.
Oh amável auxiliar, retorne, retorne!
Retorne para tua irmã, tua esposa, que te ama!
Nós não seremos separados (?).
Oh meu irmão, meu consorte, retorne, retorne!
Quando eu não te vejo,
Meu coração lamenta por ti,
Meus olhos buscam por ti,
Meus pés viajam pela Terra procurando por ti!
Deuses e homens pranteiam juntos por ti.
Deus do Sol, Deus da Luz, retorne!
Retorne para tua irmã, tua esposa, que te ama!
Retorne! Retorne! Retorne!”
Quando os sete circuitos forem completados, a Suma Sacerdotisa deposita seu sistro sobre o altar e se ajoelha próximo ao Sumo Sacerdote, com suas mãos repousando sobre o corpo dele e suas costas voltadas para o altar.
O coven, exceto a Donzela, se dá as mãos e se move vagarosamente deosil ao redor da Suma Sacerdotisa e do Sumo Sacerdote.
A Donzela fica em pé próximo ao altar e declama: (3)
(3) Escrito por Doreen Valiente, com palavras sugeridas por um hino de Natal em Carmina Gadelica, recolhida por Alexander Carmichael de Angus Gunn, um cottar (?) de Lewis.
(Vide Carmina Gadelica, Volume I, Página 133, ou O Sol Dança, Página 91). “Foi o primeiro cântico ou invocação que eu já escrevi para Gerald”, nos diz Doreen – no Yule de 1953, ela acha. Ele deu à ela a tarefa de escrever palavras para o ritual da véspera sem aviso, após o almoço, “deliberadamente me lançando no maior extremo para ver o que eu poderia fazer”.
“Rainha da Lua, Rainha do Sol,
Rainha dos Céus, Rainha das Estrelas,
Rainha das Águas, Rainha da Terra,
Trazei a nós o Filho da Promessa!
É a Grande Mãe que dá a luz à Ele;
É o Senhor da Vida que nasce novamente;
Escuridão e lágrimas serão afastadas quando o Sol chegar cedo!”
A Donzela dá uma pausa em sua declamação, e a Suma Sacerdotisa fica de pé, trazendo o Sumo Sacerdote para seus pés. Se ela estiver velada, ela retira novamente o véu de sua face. A Suma Sacerdotisa e o Sumo Sacerdote olham um para o outro, entrelaçando suas mãos entre si, e começam a girar deosil dentro do coven.
O círculo do coven se torna mais animado e veloz.
A Donzela prossegue :
“Sol Dourado da colina e da montanha,
Ilumine a terra, ilumine o mundo,
Ilumine os mares, ilumine os rios,
Cessem os lamentos, alegria para o mundo!
Bendita seja a Grande Deusa,
Sem começo, sem fim,
Perpétua pela eternidade, Io Evo! He(4)! Bendita seja !
Io Evo! He ! Bendita seja !
Io Evo! He ! Bendita seja ! . . .
(4) Pronunciado ‘Yo ayvo, hay’ (o ‘ay’ como em ‘day’). Um grito da Bacanália Grega. Para algumas ponderações acerca de seu possível significado sexual, vide a obra de Doreen Valiente Magia Natural, Página 92.
O coven se une ao cântico “Io Evo! He(4)! Bendita seja !”, e a Donzela deixa seu texto e a vela e se une ao círculo. O cântico e o círculo continuam até que a Suma Sacerdotisa grite “Sentem-se!”
Quando todos estiverem sentados, o Sumo Sacerdote levanta novamente e vai para o altar para buscar uma vela ou toco de vela. Ele a leva até o caldeirão e com ela acende a vela dentro do caldeirão. Então ele devolve a vela ou toco de vela original para o altar. Se houver uma árvore de Natal com lâmpadas, ele agora acende as lâmpadas.
Ele então toma seu lugar em frente ao altar, onde a Suma Sacerdotisa se une à ele, e ambos ficam em pé olhando para o coven sentado.
A Suma Sacerdotisa diz :
“Agora, no auge do inverno, o declínio do ano está terminado, e o reinado do Rei do Holly é finalizado. O Sol renasceu e o crescimento do ano começa. O Rei do Carvalho deve matar seu irmão o Rei do Holly e reger sobre a minha terra até o ápice do verão, quando seu irmão se erguerá novamente.”
O coven fica de pé e, exceto para os dois Reis, se afastam rumo ao perímetro. No centro do Círculo, os dois Reis ficam de pé olhando um para o outro, o Rei do Carvalho de costas para o Oeste e o Rei do Holly de costas para o Leste.
O Rei do Carvalho coloca suas mãos sobre os ombros do Rei do Holly, pressionando para baixo. O Rei do Holly cai de joelhos. Entrementes, a Donzela traz o cachecol, e ela e o Rei do Carvalho vendam os olhos do Rei do Holly. Ambos agora se afastam do Rei do Holly ajoelhado; a Suma Sacerdotisa caminha vagarosamente deosil ao redor dele, três vezes. Ela então se une novamente ao Sumo Sacerdote em frente ao altar.
O Sumo Sacerdote diz:
“O espírito do Rei do Holly partiu do meio de nós, para repousar em Caer Arianrhod, o Castelo da Roda de Prata; até que, com a passagem do ano, chegará a estação quando ele retornará a reger novamente. O espírito se foi; portanto que o homem dentre nós que abrigou aquele espírito seja dispensado de sua tarefa.”
A Suma Sacerdotisa e a Donzela vão adiante novamente e ajudam o Rei do Holly à se levantar. Elas o conduzem para a vela do Oeste, onde a Donzela retira sua venda e a Suma Sacerdotisa retira sua coroa, deixando estes ao lado da vela. O homem se vira e novamente se torna um membro comum do coven.
O Grande Rito é agora encenado, a Donzela ficando perto como athame e o Rei do Carvalho com o cálice. (Se o Sabá for realizado com todos vestidos de céu, a Donzela primeiramente ajudará a Suma Sacerdotisa à tirar seu tabard - que, sendo branco, pode então perfeitamente ser usado como o véu colocado sobre seu corpo para a primeira parte do Grande Rito).
Após o vinho e os bolos, o caldeirão é movido para o centro do Círculo, e todos saltam sobre ele do modo costumeiro antes do estágio da festa começar. No dia seguinte, quando a fogueira (se houver) estiver fria, as cinzas do Tronco de Yule devem ser recolhidas e espalhadas pelos campos ou jardim – ou, se voce mora na cidade e não tem nem uma jardineira de peitoril de janela, no parque mais próximo ou terra cultivada.
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Fonte:
A Biblia da Feitiçaria - Janet e Stewart Farrar
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